Encontros Emocionais Com a Actualidade 2009


Mirror - I'm Noy A Gun






No célebre “White Álbum” dos Beatles, havia uma canção intitulada “Hapiness Is A Warm Gun”. É sem dúvida um título contundente; exprime um aforismo de felicidade, logo agora que só somos felizes sendo tristes, mas sem causa, porque afinal aquelas canções saídas do pós-punk, como as dos redescobertos Joy Division – lembram-se das lágrimas de alegria triste de “Love Will Tear Us Apart” ou a bela depressão de “Heart And Soul” ? – tinham uma razão ligada às cidades decadentes de Inglaterra contra a actual neo-depressão intelectual artificial para quem procura ser diferente e julga que pegando numa guitarra, escrever uma melodia, calminha, certinha, bonitinha, à qual se juntam umas gotinhas de instrumentos eléctronicos, e pronto aí se tem a grande receita do momento: folktrónica. Também há a variante neo-folk-beat, à qual se junta ruído de fundo para parecer “vintage” (como quem pinta uma garrafa de vinho novo de branco salpicado), esquecendo os gloriosos tempos do folk-rock (onde tenho a particular paixão de Faiport Convention com a voz de Sandy Danny). Claro que ainda vão havendo casos de genuína honestidade criativa, como Animal Collective ou Juana Molina.
“Hapiness Is A Warm Gun”, é então um título agressivo, cuja realidade que pretende representar escasseia, simplesmente porque sendo-se feliz, perde-se a leveza de ser levemente intelectual, e receando cair na normalidade da má música comercial, encontra-se umas “bandas” (nem que sejam dois rapazes arranhando uma cordas) cuja música é absolutamente …normal! Chamar-se-á a isso pop? Antes popinho, pois nem quando os Scritti Politti resolveram corruir o “sistema” procurando vender muitos discos em “Songs To Remember” se livraram do espectro deliciosamente depressivo, como a canção agri-doce “The Sweetest Girl”, e de canções invulgares, as quais, essas sim, são Pop. Ser feliz, conscientemente alegre ou triste, é então um acto de coragem para os tempos de hoje. Daí talvez o último dos Whitest Boy Alive (“Rules”), fora do acto considerado “diferente”, não venha a ser considerado um disco para quem o quer ser.
Mas quem procure esquecer todas as considerações tecidas, e ser simplesmente feliz através do sonho, o duo Mirror isso representa, fazendo música para sonharmos. Voltamos aos tempos em que a pop não traduzia somente “short stories” ou a adrenalina da aventura à beira do abismo, mas também permitia o devaneio do ouvinte sugestionável pelo título da música, ou deixando a liberdade de escolha ao ouvinte. A alegria, vem do sonho, e da conjugação da melodia e do modo como ela está rodeada instrumentalmente. O pós-rock, que no fundo era uma revitalização do próprio rock livre de “clichés”, foi o libertador da imaginação, através dos primeiros álbuns dos Tortoise, Him ou UI. John Tejada e Takeshi Nishimoto, projectam-nos num espaço quase adimensional, fazendo lembrar o álbum homónimo dos já citados Tortoise e “Obey The Time” dos The Durutti Column. “I’m Not A Gun” é a forma simples de expressar a felicidade.

Encontros Emocionais Com Actualidade - 2008







Autor: Fujiya & Miyagi


Título: Lightbulbs


Nos tempos que correm, será que é ainda possível ter ideias luminosas, depois de no campo da pop depois de tudo ter sido inventado? A canção já passou da sua forma popular vinda da tradição dos jograis, passando pela rua, pelo teatro, pela divulgação mundial com a rádio, a imprensa a indústria e agora a “Internet”, até se tornar num produto analítico de qualidade estética e melódica duvidosas, mas no mínimo com uma harmonia, mais do que nunca, cientificamente estudada para agradar às massas – só assim se justifica que a rádios mantenham uma “playlist” que se repete 8 vezes ao dia sem cansaço da maioria quem as houve. Por outro lado, em pleno início do Século XX, experimentar não é condição implícita de futuro. Então qual o caminho a seguir hoje, para produzir uma obra honesta? O do sincretismo ou o da reabilitação da estética vinda do passado. As fronteiras diluíram-se: já quase não se faz folk sem que um farrapo de electrónica esteja presente; esta por seu lado, vive dias difíceis pois funciona muitas vezes em regime de automatismos decalcados, então pode-se recuperar a história deitando alguma luz que permita, além da releitura dos factos, uma frescura de quem está a descobrir o mundo. Os Lions, recuperam o raggae, fundem-no com o funk e a melancolia do jazz do Etíope Mulatu Astatke. Os múltiplos projectos do grupo ligado aos Quantic Soul Orchestra, depois de reavivarem o funk suculento, resolveram agora navegar entre a América Latina e as Caraíbas, e os Fujiya & Myiagi, ressuscitaram a máquina rítmica dos Neu! com intromissões dos Wire. Ideia luminosa? Talvez, mas eles decidiram antes seguir o caminho de uma desconcertante honestidade, expondo as suas influências sem subterfúgios intitulando o álbum de “Transparent Things”. E para o capítulo seguinte, então sim, com a consciência e segurança de um trabalho bem feito, e seguindo a linha de absorver referências para delas tentar reconstruir um quadro novo, surgiu a luz. Que nos oferece “Lightbulbs”? Sobre uma matriz nunca muito distante da força moptriz erguida pelos Neu! ou Can, continuam a não esquecer-se dos Wire (na sua segunda vida), recuperaram a balada de razão romântica dos Faust, têm laivos de tons lúdicos, reconstroem uma pintura primitiva de hip-hop para recrearem com esta uma canção, sustentam a canção com os pilares mínimos como nos blues, e tudo isto com uma secura harmónica inspirada em James Brown. Não se trata de uma passo definitivo rumo ao futuro, mas de um vector inclinado de quem vivendo num mundo difícil procura ainda a felicidade da criatividade fundada na história, mas nunca deixando de olhar em frente.






















Artistas:


AIFF-Afro Soulsystem

Osaka Monaurail-REality For The People

Hot 8 Brass Band-Rock It With The Hor 8

Orgone-The Killion Floor


Dir-se-ia que na história não é nova, até porque trata-se acima de tudo da revitalização de uma linguagem ancestral, que retoma os mesmos contornos para quem procura um ponto-de-fuga para uma novas perspectivas da pop. O futuro, tal como sonhámos nos anos 90, não está presente, mas há uma sensação de que se não se deu um passo em frente, também não foi um desvio, nem houve propriamente uma estagnação, antes um movimento de um corpo musical que atravessa continentes, e quase com 100 anos de história, e até já foi sujeito a várias transmutações genéticas, e no entanto, a inércia da enorme massa histórica do qual é constituído, possui uma leveza enorme, e à mínima introdução de energia, reage com um movimento de leveza, deslocando-se em frente, nem que seja por breves milímetros.

Assim se antes haviam mitos de espíritos musicais quase reservados e determinados grupos étnicos ou até de um certo país, com as migrações de culturas, pessoas e até informação, já nada tem um ponto geográfico certo de existência, sabemos apenas da sua existência no mundo. Há antes um lugar estético a unir pessoas militantes da mesma paixão. O “krautrock” à luz dos Can e Neu!, foi revisto na Alemanha, ou antes na Escócia com uma camuflagem japonesa? O “r’n’b” de Chicago, ainda terá lugar no Século XXI? O “funk” de árvores assentes em Detroit e raízes a espalharem-se de forma imperceptível pelos Estados Unidos, não poderá ter perdido folhas pelo mundo, e partir daí novas plantas nascerem em Inglaterra, em Espanha, ou até no Japão? Será possível a um país sujeito a abalos sísmicos, sobreviver a réplicas intensas, precisas, concisas mas fortes o suficiente para expressarem um corpo em simbiose com a alma? E aquela música cujas origens remontam a uma Praça de Nova Orleães, retornando a África para gerar essa potência rítmica enorme à qual os músculos do corpo e alma não conseguem ficar indiferentes, explodindo de alegria mesmo quando a mensagem é satírica e expressão de dor, só existirá em na Nigéria ou no Ghana?

As respostas às perguntas são de que agora é possível definir à luz da história, a localização da raiz mas não da produção. O afro-funk de matriz Fela Kuti, pode ser encontrado na Holanda. Os AIFF centram a sua actividade rítmica na Nigéria, mas a sua espiritualidade no encontro da Jamaica com a terra prometida, África, ao intitularem o seu álbum Afro Soul System. Osaka Monaurail, reclamando o mito da perfeição tecnológica japonesa, fizeram um “sacanning” ao funk tenso e minimal de James Brown, mas adicionaram-lhe a paixão de quem gosta de filmes “blaxpoitation” e, sobretudo, foi capaz de traduzir o sonho de um dia ter assistido a uma sessão de gravação de James Brown ficando extasiado com o delírio vivido por músicos de excepção. Os Hot 8 Brass Band, tentaram de uma forma simples construírem com a música, uma máquina do tempo, levando-nos para Jackson Square em Nova Orlães, onde os negros viviam uma intrínseca alegria rítmica. Finalmente, de LA, os Orgone sintetizam a música até aqui explorada: o tambor de África, o desejo de expressão de liberdade através do ritmo – que afinal “this nor a fashion this is not a trend”-, a fusão jamaicana que resultou no raggae, e a raiz do ritmo plantada no imenso quintal do continente Norte-Americano, onde cresceu em Detroit, Chicago, Memphis, S.Francisco ou Filadélfia e cuja rega espalhou-se para as Caraíbas, e depois para o mundo, fazendo crescer as plantas da alma, por aí.

Diz-se que o bater de uma asa de uma borboleta em Pequim, pode provocar um terramoto na Bolsa de Nova Iorque, mas uma semente transportada nos Séculos da escravatura originou uma música, hoje traduzida à escala global, e que deveria ser intitulada, sim de World Music. Para bem da paixão.

Encontros Emocionais Com A Actualidade- 2007




Autor:
Ebb
Título:Loona

Tudo terá começado quando os Romanos dominavam a Gália. O sobrinho Goudurix do Chefe da pequena e indomável aldeia Gaulesa, trazia de Lutécia os ritmos fortes da noite, aos quais aderiram rapidamente o Bardo e Obélix. De caminho, os Normandos de visita à Gália, foram contagiados com estes sons estranhos. A princípio não gostaram, (até tiveram medo!), mas uma semente terá ficado. Eis-nos no Século XXI, e do Norte vem da melhor pop que se faz no mundo. E toda a gente se interroga porquê? Além da resposta no início deste parágrafo, mais uma razão encontra-se na boca de um dos senhores do ABBA, no documentário “História da Música Popular” que passou na RTP2.

Segundo Benny Andersson, quando os ABBA surgiram na Suécia, a música que se ouvia na rádio era apenas de teor político, nada de verdadeiramente popular. Como o mundo caminhou para a globalização, à qual é impossível resistir, com a rádio, primeiramente, depois os canais de televisão por satélite, e agora a Internet, nem a Suécia resistiu à invasão da música popular. Mas como não foi infectada pelo lixo não reciclável da música industrial, fez uma triagem do que melhor se fez ao longo do tempo. Por outro lado, os instrumentos musicais, acústicos ou electrónicos, esses sempre foram universais, então até chegarmos aos dias de hoje, houve um processo lento de assimilação e aprendizagem para agora desabrocharem as lindas flores pop.

Ebb, aparece sozinho numa capa bucólica com a viola, porque afinal, o processo criativo pode às vezes ser um acto solitário, mas este instrumento é apenas um sentido figurado da música que iremos encontrar. As referências são as melhores: Human League, Sudden Sway, Electribe 101, Beach Boys\Brian Wilson e os imerecidamente esquecidos Sufi-Live Is Rising de Rudi Tambala ( o "R" dos também inflizmente esquecidos A.R.Kane). “Loona”, pega onde “Life Is Rising” nos deixou: canções de amor, confissões íntimas ("I’m All Made Of Music"), numa coabitação entre a electrónica e a guitarra (mais discreta que em “Life Is Rising”), e com consciência de que o uso dos instrumentos electrónicos, por si só, sem força criativa e imaginação não conferem à música o poder do sonho. Björk, que anda há muito perdida no (seu) mundo, em vez de encenar a grandiosidade dos seus sonhos, se algum dia tivesse encontrado Ebb, teria feito de Vespertine um disco para nos lembrarmos. Mas, voltando ao sonho, “Loona” é como se um dia o génio de Brian Wilson tivesse tido um enconto com a riqueza da criatividade racional, mas humana, dos Kraftwerk.









Autor: Studio
Título:West Coast


Estamos perante um simples caso de paixão pop, onde se recorre ao método poço\fonte. Primeiro o poço, onde tudo é absorvido; "Haçienda", New Order, Happy Mondays, Durutti Column, 808 State, guitarras de funk-psicadélico da pandilha jamaico-brtânica Cymande, Duran Duran, últimos estágios do "disco" com sintetizadores e até a coragem de Fela Kuti para fazer uma composição pop com 16 minutos. A seguir a fonte, daquilo que foi assimilado, quase que nasce um nova liguagem pop, com aquela capacidade de propôr o prazer da paixão e aventura que qualquer disco deve proporcionar. Não será o melhor álbum do ano, mas é aquele onde se volta para uma viagem de felicidade, sempre que necessário.

PS São suecos.


Título:
Spooks (Dupla Identidade)
(Série de Televisão Britânica)




O facto de ter alguma idade, permite-me já ter alguma visão da história e de factos sobretudo relacionados com o nosso país, como era de esperar aliás. E tendo mantido uma certa paixão em relação à TV e Rádio, é curioso ver como antes se vivia com um canal, depois dois, a seguir o advento das parabólicas com a CNN e a MTV, o surgimento das televisões privadas em Portugal e finalmente o recurso do sinal por cabo. Igualmente, com o sinal digital a mandar no mundo, o mercado audio-visual tornou-se mais acessível. Mas, como em tudo, há o reverso da medalha. Mais do que nunca, a homogeneidade e a "ditadura" da moda Norte Americana, esmaga nas salas de cinema e na televisão quase toda a produção extra-americana.
Portugal, agora perfeitamente integrado no mundo, não resistiu, e os nossos programadores (cinema e tv) dão-nos quase só uma dieta americana, cujos valores estécticos e sociais parecem ser os universais. No entanto, sendo americano, se algo sai fora do padrão em vigor, não tem a mesma visibilidade, e só assim se explica que o último Lynch tenha passado em pouquíssimas salas. Claro, estamos no território do utópico, do mistério nem sempre decifrável, e neste caso, no arrojo de se fazer um filme fora dos 90 minutos padrão de diversão quanto baste para passarmos para o dobro.
Mas quando Portugal ainda era uma ditadura, ou dava os primeiros passos na consolidação da democracia, ainda se ouviam e viam ecos do mundo francófono e britânico. Os polícias ainda eram franceses, sem a ciência do CSI atrás, e os crimes complexos jogos mentais. O inspector Maigret, falava com os assassinos, interrogáva-os e pelos olhos e gestos, conseguia descobrir o caminho para a confissão. E de Inglaterra, além da paródia divertida com champagne, beleza femenina, cavalheirismo inglês, chapéu de chuva, fatos de bom corte e carros britânicos, Rover, Triumph e Jaguar, tínhamos como referência o rio Tamisa, com a "Thames Television" e o acorde de orgão que todos tentávamos descobrir com os nossos instrumetos rudimentares em casa. Os americanos, havia-os, com "Search" (Pesquisa), mais tarde "Culombo" o detective excêntrico de gabardine com fixação nos sapatos italianos e no seu "rare french car" (um velho Peugeot descaputável).
Agora, que temos? Os carros são jipes potentíssimos a roncar e gastar mais gasolina num quilómetro que o equivalente europeu ou japonês, os detectives, são todos inteligentíssimos, dizem que sabem latim para parecerem géneos, ou então são modelos de reclame de champô. As meninas, estão mais próximas da "passerelle" que da preocupação de resolverem um crime, além de existirem computadores e "software" miraculosos (embora não falem como HAL9000).
Contudo qual será o porquê desta nova onde de séries? Penso que há três razões para tal:

1-Com a força da publicidade, estamos todos centrados nos "blockbusters". Sabemos à partida que o espectáculo será pobre, mas há a necessidade de perceber a razão pela qual o lixo vende tanto,

2-O planeta vive à velocidade da luz. Já não há tempo, nem paciência, para ver um filme que durante 120min., no máximo, exigindo concentração, uso do intelecto e viver de emoções tão próximas de nós, apesar de estarmos perante uma ficção, enquanto numa série, o "comprimido" engole-se bem, não dura muito e estamos no conforto do nosso sofá,

3-O negócio da indústria cinematográfica, impede cada vez mais rasgos de criatividade, enquanto que produzir uma boa série poderá ser barato e fácil de explorar para as estações televisivas, devido aos intervalos para publicidade.

A série em destaque, afasta-se no entanto do padrão televisivo daquelas cuja moda e a as televisões da moda, obrigam a ver. Os episódios duram quase uma hora, contra os "standard" 45 minutos norte-americanos, os heróis, não os há, são antes anti-heróis, o bem e o mal são conceitos estranhos com que as pessoas se debatem, o mal nem sempre é muçulmano, pode até vir do lado cristão ou no seio das instituições, e as personagens perdem o fôlego e têm problemas comuns a todos nós. Além disso, há linhas de diálogo muito fortes,"África foi sempre um estorvo para nós e ainda temos de aturar as estrelas pop", e gestos de democracia: a televisão de notícias vista não é a da produtora, a BBC, mas antes a Sky News. As instituições são postas em causa, governo, serviços secretos e justiça. O inglês é complexo e obriga a ir ao dicionário. Além disso, é inglês e não americano, e isso deu-me mais trabalho para perceber. Por fim, sendo uma série de espionagem, os casos apresentados são concretos e com a infeliz possibilidade de serem reais. Claro, no meio disto tudo há um problema grave: "Spooks" não passa no canal da moda Fox, não faz parte do culto dedicado às séries por quem quer passar por intelectual e não tem as canções pop da moda, feitas por gente convencida mas cuja qualidade é tão má quanto qualquer canção do dito mundo "pimba". Não há musiquinha triste ou alegre para a cena exacta, há um "drone" permanente para manter a tensão, mesmo quando os espiões choram. E há ainda mais outro problema: é preciso ter coragem de em público dizer-se que vê a "BBC Prime", ou o canal "People+Arts", para não se ficar de fora do culto da moda.
Para acabar, gostaria de dizer que nem tudo é mau: "Spooks" não passou despercebida de todo, e uma conhecida cadeia de lojas francesa, importou as três primeiras épocas, embora seja muitíssimo mais barato comprar na amazon.uk.

PS1 A série contém 5 temporadas. Reproduzi a capa da 4ª, a minha favorita.

PS2 Peço desculpa por no texo acima, me ter esquecido de referir a fabulosa série norte-americana "A Balada de Hill Street" (Hill Street Blues), que está agora a ser reposta no canal por cabo RTP Memória. Considero imprescindível, e poder-se-ão aperceber como as séries da FOX e AXN são maioritáriamente paupérrimas. Agora, já não existe a realidade.

















Autor:Jimi Tenor
Título:Joystone

Afinal de onde vem o futuro? De África? De Saturno? A Terra, como polo aglutinador de civilizações do mundo faz a síntese yoruba-funk de Fela Kuti com a visão das partículas dos aneis de Saturno, portadoras de sonhos e som com sabor afro, materializados por Sun Ra. Jimi Tenor e mestres, cá na Terra, vão varrendo o céu em busca do contacto com possibilidades focalizadas na síntese atrás descrita. Planet Earth Transnitting!





Autor:
Vanessa And The O's
Título: La Ballade d'O

Vanessa And The O’s – La Ballade d’O


“ I recall a bigger brighter , A world of books and silente times in thoughts”, “… to die by your side, is such a heanvenly way to die”, “ Don’t walk aways in silence, Don’t walk away”, “ If you think the world is a machine with one cog, And that cog is you or the things that you, So you are not in this world, the world is not you”, “I’m sitcking with you, ‘Cause I ran out of glue”, “Turn off your mind relax, And float downstream”, “É p’rá amanhã, Se não for para depois”, “Efectivamente gosto de aparências”, “Memory wates, never wastes” como cantaram os Go Betweens.
Acabo de citar, de memória, e esta falha logo poderão ocorrer erros, pequenos versos, palavras, de canções que forma preenchendo a minha vida pop. Ora, e esta é uma das principais particularidades da pop, fazer-nos cantar, pois só assim nos poderemos apaixonar por uma canção. Foi sempre sim, desde os tempos da idade média, até à criação do cilindro de Edisson, ou da grafonola, passando pelo vinil, CD até à imaterialização da música convertida apenas ao símbolo digital. Mas, sempre, o propósito máximo, foi provocar uma empatia entra a melodia e as letras, para depois o ouvinte\consumidor, a memorizar e repetir nos várias actos da sua vida – os blues nasceram também das canções de trabalho nos campos de algodão. Contudo, para quem ama a pop, provavelmente se deram conta que as citações do parágrafo anterior estão limitadas a um domínio temporal do Século XX limitado – algumas dos anos 60 e o resto dos anos 80, quando no fundo iniciei a minha iniciação à “indy pop”. Tudo isto para chegar à questão, a pop, ainda se canta pela vida? Algum de nós consegue de imediato, citar um verso uma linha de uma canção gravada e difundida nos últimos 16 anos, excluindo alguns excelentes textos de hip-hop ou de “diseurs”? Nos tempos que correm, eu não me lembro, até porque o “funk”, revitalizado a níveis de grande interesse por gente como Quantic, ouve-se, absorve-se com o corpo e a alma, mas não se canta, nem sequer se pega numa viola arrumada ao canto para imaginar a voz de Alice Russell, algo que se fazia com Morrissey dos Smiths , Lou Reed ou a dupla Go Betweens.
Pois é, a pop, está perfeita, mas pobre. No campo comercial, é dirigida cientificamente ao mercado das rádios indolores, onde a mesma música em cada estação passa com um intervalo não mais de 5 min. Na área da pop dirigida a quem gosta de por vezes sentir o desconforto emocional, mas apercebe-se do sabor de viver e da simbiose emoção\razão, é tudo muito belo e perfeito, e afinal, o a alma é apenas acariciada e não se enterra na profundeza da alegria ou até tristeza de uma canção. Resultado, para quê cantar, se esse é um acto de libertação de emoções e de acompanhamento no acto de viver? Para quem foi formado na excelência de muitas canções dos anos 80, agarrou na viola para, mesmo que de forma muitas vezes imperfeitas, apercebia-se melhor da razão e emoção do acto de criação.
Vivemos num mundo pop perfeito, com uma facilidade de gravar um disco com uma qualidade de som mínima, e nem sequer já ninguém se dá ao trabalho de à volta de uma fogueira, fazer umas “campfire tapes”. E isto, serve-nos de alguma coisa? Não, para mim. Mas por obra do acaso, surgiu no horizonte um disco, com a capacidade de, momentaneamente, salvar-me (nos) do desespero. Vanessa and The O’s, álbum “La Ballade d’O”. São franceses, cantam em inglês e francês, numa mesma numa canção ou em exclusivo, e fazem tão somente uma coisa tão simples: canções pop! Que saudades! Depois há refrão para cantarolar, sem propósito, mas que tudo define: “Chante la chansson perpetuelle, Chante la chansson la bagatelle”. Está definido o caminho para aquele arrepio na espinha, a necessidade de voltar à guitarra, descansar do deliciosamente consumidor funk ou raggae, e … cantarmos. “Reste la lune s’en va avec paresse”, bonito, não acham? E vai tudo assim, “de olhos fechados”, com um mar de guitarras – “plus rien me presse”. Há quase 17 anos esperava um disco assim, onde até temos uma confissão de amor de fã: “ Sweet soft as dusty, Is the feeling I get for singing his words, As I am still waiting , I stare into clouds from the back stage kitchen, he will come, And walk through that door, second floor”, a canção chama-se “J’Attends Lou”. E assim, eu, e muitos outros amantes da pop, vamos voltar a substituir as cordas enferrujadas, magoar os dedos, mas com alegria. Vanessa and The O’s, poderia ter sido uma “jam session” onde, por sorte, Nico se cruzaria com os Luna, com laivos de arranjos de Mick Harvey, e a doce gentileza da arte produzida por François Truffaut.
Estamos perante um exemplo de música imperfeita, feita para pessoas imperfeitas, na procura do prazer da vida nos pormenores, com capacidade de contagiar os saudosistas conscientes das canções que amaram. Até o estranho Dr. House, esqueceria a sua amargura.

COCKTAIL DE EMOÇÕES





Koop - Islands

E

A Matter Of Life And Death - Filme de Michael Powell e Emeric Pressburger




As artes nunca hão-de estar totalmente dissociadas, havendo sempre um elo de ligação, mesmo se não concreto, ao menos a nível emocional. E se a música, no caso do cinema, é um elemento essencial para o acentuar dramático, poderão existir correlações, por exemplo, com a pintura. Eu nunca mais de hei-de esquecer de quando vi uma fotografia de uma composição de cores de Modrian, o associei imediatamente a uma fantástica colectânea que na altura andava a descobrir – a mítica e sublime “Headz” (1º Volume) da Mo’Wax.
E hoje, ao ouvir “Islands” dos Koop, associo-o ao filme da dupla de Michael Powell e Emeric Pressburger “ A Matter Of Life And Death”. Claro, há uma certa ligação temporal. Os Koop ressuscitam o “swing” e “A Matter…” decorre durante a II Guerra Mundial, anos 40 quando o “swing” dominava o jazz e os salões de dança. No plano da narrativa, não há grandes conecções, as canções dos Koop são histórias de amor deliciosas, e o filme é uma história de amor sim, mas num plano quase sobrenatural – há uma disputa entre o céu e a terra. Mas, como já escrevi, a pintura, e sobretudo as cores, poderão estar associados à música. E as cores de “Islands”, são para mim, as do arco-íris obtidas através de um prisma de uma luz branca, quase o branco acizentado do céu de “A Matter...”, onde o prisma é a paixão pela vida, e esta definitivamente tem cor.
Quem ganha, o céu ou a terra? O mundo teóricamente perfeito, ou o amor terreno, com felicidades, triztezas, momentos de brilhantismo e outros mais apagados, certezas indomáveis e fragilidades surgidas não sabemos de onde? Em “ A Matter…”, o céu nem sempre tem piada porque “não é em technicolor”, enquanto com os Koop, música celestial para um salão de baile ilusoriamente perfeito, flutuamos por minutos sobre a vida, e sonhamos que estamos no … céu! Em que ficamos? Nas duas coisas. De um lado um disco belíssimo cheio de alegria e ternura, complemento ideal para ser ouvido após visionarmos “A Matter Of Life And Death”. Um maravilhoso “cocktail” de emoções.

Nota: "Uma Questão de Vida ou de Morte", já foi editado em Portugal.

Novidades No Blog

Agora há dois Encontros Passionais, o de 2005, 2006 e 2007.

-Em Encontros...2007, Spooks (Série de televisão britânica)
-Em Econtros... 2006, Beck-Information.
-Em encomtros... 2005, Jazzanova Remixes 2002-2005.

Encontros Passionais Com A Actualidade - Ano 2006






Autor: Beck
Título:Information
Comentários:

Estamos na sociedade da informação. Tudo agora é transformado, até a ficção é já não tem direito a função própria, é obrigada a seguir o caminho informativo, ou, mesmo que não tenha base para isso e seja um puro devaneio artístico, é logo interpretada como uma futura base de dados. Perante este domínio para quê contrariá-lo? Beck, inteligentemente, decidiu intitular o seu álbum “Information” e de forma preversa, esta é agora obrigada a converter-se em ficção. E assim, entramos num mundo talvez não de sonho total, mas antes do retrato de uma realidade presente, onde por vezes se procura um patamar de evasão, nunca deixando contudo a gravidade que nos une à terra. Algo que os Disposible Heores Of Hiphoprasy já fizeram em “Hipocrasy Is The Greatest Luxury”.
Beck também já conseguiu para si o estatuto de artista com direito a publicar em música o que lhe ocorre na vida: os livros lidos, os filmes vistos, as notícias do quotidiano reflectidas de acordo com o seu posicionamento na vida, as obras plásticas vistas, e, claro, os discos ouvidos. Então já pode trazer o seu conhecimento da história da música, onde alguns dos seus discos favoritos deverão ser “Revolver” dos Beatles, os já mencionados Disposible Heroes e uma rigorosa colecção de hip-hop, a cosmicidade de algum rock dos anos 70, um breve referência “motorik” dos Neu, discografia seleccionada da pop “indy”incluindo a mítica 4AD, blues rural, as curiosas experiências das canções “in the key of z”, o ecléctico Herbie Hancock e tudo isto numa possível perspectiva de Stanley Kubrick de “2001 Odisseia No Espaço”. E como estamos num mundo de informação e sem fronteiras – afinal já Michael Franti dos Disposible declamava “the planet shrinks by speed of communiction” - onde já não sabemos por vezes onde localizar fisicamente e temporalmente os factos, todas as influências confluem milimetricamente – daí talvez a capa ser uma representação de papel milimétrico - para um cenário sonoro onde as colagens são feitas para assegurar a emoção pretendida para cada momento da canção.
E depois, há o conceito de cultura pop. A já mecionada representação do papel milimétrico, uma coisa tão banal mas que afinal poderá ter um sentido estético como uma banana pintada numa capa sem razão aparente, e a colecção de autocolantes num poster para podermos manipular ao nosso prazer, conferindo assim um cunho pessoal à obra que temos em mão – ou será apenas mais um catálogo de supermercado dos que aparece no correio como Étienne de Crécy nos quis fazer crer na colectânea Super Discount?
Estamos perante um disco excepcional, que revela lucidez, capacidade de risco, creatividade e sobretudo ressuscita a pop tal como ela nasceu para ser: divertida, alciante, mas mesmo assim com capacidade de ter consciência social. No fundo um álbum que poderá estar para esta década como Screamdelica dos Primal Screma esteve para os anos 90. Absolutamente fabuloso!



Autor:
Mummer
Título: Soul Organism State
Comentários:

Ao ler o título deste álbum – Soul Organism State -, uma questão se levanta no meu espírito: será a “soul” a mãe de todas as músicas? Poderá este estilo de fazer pop, pertencer à parte intrínseca do organismo que não se mede, não se analisa e apenas se sente? A história tem numerosos factos que fazem tender a resposta para o “sim”. Não terá sido por acaso que nos anos 60 se cantou “Dancing In The Streets”, e afinal, o ser humano não consegue resistir a um bailarico, a uma forma de expressão musical popular que faça impelir o corpo para a dança, seja num arraial, festa popular ou até na mais sofisticada discoteca. Por outro lado, a canção com mais ou menos ritmo, foi, ainda é, forma de exprimir alegrias, tristezas, é usada como estímulo para o trabalho físico e até para expressar credos de fé. E portanto, tudo isto sai da alma. É matéria orgânica sentimental.
Mas, os exemplos de fontes de inspiração vindos “da alma”, estão presentes em toda a existência pop. O mais camuflado, mas muitas vezes confesso, é o caso dos Beattles. Afinal, eles foram a primeira experiência do intitulado “northen soul”, já que com o porto de Liverpool, puderam ter acesso às primeiras novidades vindas sobretudo da “Motown”. E depois, já a caminhar para o final do Século XX, foram de duas das mais importantes cidades de música negra, Detroit e Chicago, que o futuro, tal como hoje o conhecemos, surgiu com o “techno” (Detroit) e o “house” (Chicago). E mesmo no limiar do Século passado, a “soul” esteve na origem de uma nova forma de compor canções pop, recorrendo à experiência “contemporânea popular” do hip-hop, e este já se sabe a qual matéria-prima recorreu. Hoje, por exemplo, é muitíssimo comum no neo-folk, encontrar riachos de electrónica no meio de melodias lindas, e isso deve-se ao “trip-hop” dos primeiros trabalhos dos Massive Attack e Portishead.
Após os dois parágrafos anteriores, não pretendi demonstrar que a “soul” é de facto a “mãe de todas as músicas”, mas os factos apresentados são indesmentíveis, e, portanto, para alguns, realmente há música que pertence ao organismo, tornando-se uma obrigatória forma de vida. O que parece ser o caso de Stefan Juragmain, já membro dos Mum, e por isso agora junta o sufixo “mer” – daí “Mummer”.
Creio então já não existirem dúvidas da música encontrada em “Soul Organism State”. A canção soul com arestas ligeiramente por limar, para lhes conferir arrojo estético, contornos jazz , “spoken-word” e ainda “blues”. No fundo este álbum dos Mummer é uma síntese de experiências feitas ao longo dos anos, mas que ficaram confinadas ao seu espaço, por muito boas que tenham sido, faltando o grau de fusão soul para se avançar na história. Assim “Soul Organism State” traz o ritmo de “Rhytmic Alterated State” de Ras (onde também haviam blues), recupera a canção perfeita de travo soul\jazz de “Is You Is” dos Micatone, onde faltou uma pontinha de nervo, e a electrónica dos Sonoluce que esteve a um passinho de pode fazer história tivesse enveredado pela composição soul. Conclusão: “soul\gospel” para o Século XXI.


Autor: The Bamboos
Título: Step It Up
Comentários:

A hsitória, conta-nos que o funk andou sempre por perto, nunca nos deixou efectivamente, mesmo que andasse por aí comuflado. Observe-se, quando do surgimento do hip-hop, foi o funk a servir de base para as primeiras experiências, e James Brown passou a ser encontrado em pedacinhos pelo mundo. Depois, com o advento da electrónica nos anos 90, o funk continuou a ser seguido por perto, houve até quem tivesse feito umas "Funkin' Trip-Hop Variations" (Alex Cortiz), mas foi depois da tempestade passar, na aurora de um novo milénio, que se regressou às bases. Quando as máquinas deixaram de servir de estímulo para a construção de boa música, nada como voltar aos instrumentos. Foi um tempo de reflexão, intitulado como "Define\Discern" (The Poets Of The Rythm), onde se procurava a segurança de um novo caminho de encontro às origens - e os mapas dos anteriores tesouros perdidos no tempo, como "Midwest Funk", "New Orleans Funk" ou "Texas Funk" ajudaram à re-descoberta. E esta foi a plataforma de trabalho, para o que haveria de se seguir. Os Quantic, encontraram também coragem para deixarem o "sample" e se aventurarem no mundo da realidade concreta, pelo meio encontraram uma "caçadora branca de coração negro", a fantástica Alice Russell, e começaram a defdinir uma nova trajectórira - no fundo, um encontro com o básico sistema de bateria, baixo, guitarras em curtos mas contínuos disparos, espamos de sopros e possibilidades de se encontrarem fontes de orgão a jorrar notas de síncope.
Agora os The Bamboos, continuam a intermimável estafeta de encontro com o funk direccionado ao coração, sem nunca esquecer como um estímulo intlectual pode muito bem subreviver, sem perder qualidade, com o físico. Absolutamente delicioso.
PS Já agora não percam a colectânea formada por Will Holland (Quantic) intitulada "The World's Rarest Funk 45s".


Autor: Fujiya & Miyagi
Título: Transparent Things
Comentários:

A honestidade, fica sempre bem, ainda por cima, quando estamos perante um caso de talento. Assim, o que se espera, está plenamente esclarecido logo no título do álbum, além de terem deslocado o centro da acção para o imaginário do Japão, onde tudo é possível. Este foi então um acto inteligente, pois situando a narrativa noutro país que não o de origem, afinal são escoceses, conferem uma imagem de globalidade para a linguagem musical que recuperam. E afinal, de que se trata? Tão simplesmente de "krautrock", no seu estado mais avançado, isto é, já a caminhar para a segunda metade da decada de 70. A estrutura básica, é inspirada nos míticos Neu!, com a arquitectura rítmica precisa como uma máquina de alta velocidade - alusão à célebre estética "motorik" dos Neu! - embora havendo espaço de respiração para a perfeita canção pop composta pelos Can em "Future Days". E ainda há tempo para breves citações aos Wire - do final do primeiro ciclo de existência e dos tempos da reencarnação. Estamos perante um disco que procura na história uma reciclagem para o futuro, ousado, mas linearmente belo. "Transparent Things" é a exacta definição.


Autor:
Tom Moulton
Título: A Tom Moultom Mix
Comentários:

A Soul Jazz, famosa loja de discos Londrina e também editora, tem vindo a reconstruir pedacinhos da história da música popular, numa perspectiva abrangente no plano geográfico – o caso das cidades de Londres, Nova Iorque e Kingston -, mas global na área musical – soul, jazz, funk, new wave, no wave. Chegou agora a altura de, numa certa forma, fechar um ciclo. A colectânea “ A Tom Moulton Mix”, encerra um capítulo iniciado há quase meio-século pelos mestres jamaicanos, e absorvido, uma vez estudado, por alguém que os conhecia, tinha relações de amizade com um deles, o mítico Clement Dodd, e viu num processo de reorganização sonora, uma afirmação musical para um acto de liberdade, que de grito em surdina até pleno de direitos, fui surgindo em Nova Iorque nos anos 70.
Há pouco mais de trinta anos, as comunidades “gay”, procuravam viver o seu amor à vida, mas as leis eram restritas, e mesmo no Estado de Nova Ioraque, em recintos fechados, por cada dois homens, teria de haver uma mulher. Nos embrionários clubes, os “gays”, tinham de chegar sempre com uma amiga, para assim despistarem as autoridades, podendo finalmente sentirem-se livres nas então nascentes discotecas. E a música, era o catalisador para a libertação dos sentimentos obrigatoriamente reprimidos. Mas não só, o contexto histórico geral com a depressão do pós-Vietename, levava as pessoas a uma introspecção que se fazia através da dança. E é aqui que nasce a importância de gente como Tom Moulton.
Como se escreveu, os clubes eram embrionários, mas o bom gosto dos Dj’s e audiência imperava para a felicidade despontar, então a música cuidadosamente escolhida, embora maioritáriamente soul, era a força motriz para se atingir a alegria. Contudo, os “singles” geralmente só têm canções de 3min., mas para manter o climax, ou se passavam as versões dos álbuns, ou então duas cópias da mesma canção. Ainda se tentou chegar aos 5min.33s., mas não era ainda o suficiente. Por vezes, usavam-se também discos alusivos a efeitos sonoros, conseguindo-se o nível de entusiasmo latente até à próxima música. Até que um dia, por obra do acaso (à semelhança do dub que também nasceu como um azar de estúdio), chegou-se ao tão afamado 12” a 45rpm. Estava encontrado o meio para permitir que uma canção se fizesse dançar quase eternamente. O disco, substituindo as orquestras, tonou-se ele próprio etiqueta de uma estética tradutora de um soul orquestrado, bem cantado e com uma síncope mais linearizada, não tão acentuado quanto o funk.
Tom Moulton, um branco, apaixonado pela música, especialmente negra, com uma exigência fora do comum relacionada com a qualidade do som e um sonhador, pois procurava a utopia da canção eterna, agarrou nas canções que gostava, e conferiu-lhes um estatuto de pequenas metragens maravilhosas, onde à qualidade intrínseca da música, se juntava a possibilidade, quase imperiosa, de a dançar. Contudo, ao contrário dos mestres jamaicanos, com quem “estudou”, em vez da desconstrução gravitacional do dub- os elementos sonoros gravitam em trajectórias diferentes à volta do núcleo rítmico baixo-bateria -, Tom Moulton remistura com a intenção proceder a um rearranjo orquestral, ou quase como no jazz, os instrumentos saem e entram conforme o “timing” necessário à improvisação. É delicioso! Este álbum, além do indiscutível valor histórico, é acima de tudo a demonstração de um acto visionário, hoje tão em voga, que todos os aprendizes ou amantes da música de dança deverão ter como manual obrigatório.










Autor: Tony Allen
Título: Lagos No Shaking
Comentários:

Nos dias que correm, poder-se-á pôr a questão: será ainda válida a matriz de afro-funk legada por Fela Kuti? A resposta é afirmativa, até porque se encontram rastos dessa maravilhosa música de intervenção, onde a tradição rítmica da tribo Nigeriana Yoruba se fundiu com o jazz e o funk ocidentais. Basta ouvir o primeiro álbum dos Antibalas, ou ainda Ras e Quantic, para perceber como uma ideia cujos cristais se solidificaram no início dos anos 70, permanece válida. Fela já não está entre nós fisicamente, mas aquele que criou os alicerces para o edifício do afro-funk, o baterista Tony Allen, continua a poder gravar com relativa regularidade.
Conta-se que sem Allen, Kuti não teria edificado aquela moderna linguagem transgénica, já referida no parágrafo anterior, e que igualmente serviu de matriz a toda uma geração de músicos Nigerianos e outros oriundos também do Gana. A importância histórica de uma energia bruta libertada espontâneamente , reflecte-se nas inúmeras colectâneas editadas nos últimos quatro anos, onde destaco as excelentes Nigeria 70 e Ghana Sounz.
Tony Allen, é então uma lenda viva, de uma época de criação excepcional, cujas raízes mais profundas tenta agora conservar com a edição de um novo álbum este ano. E confesso a ansiedade que tinha perante a expectativa gorada no anterior trabalho intitulado “Home Cooking”, sobretudo depois de ter tido o primeiro contacto com o sobre-excelente “Black Voices”, onde se servia funk com um forte mas agradável travo africano, era enorme. Agora, a intenção foi boa; regresso a Lagos, onde tudo começou, gravação com músicos locais, variação entre a matriz de origem e a raiz tradicional, e um grafismo a fazer lembrar as capas interventivas quer de Kuti e o do próprio Allen em início de carreira, patrocinada pelo seu mentor. Mas, tudo não passa da pretensão de uma boa ideia. Começa bem o álbum, mas depois resvala para uma perda de rumo, onde não se sabe se se pretendeu fazer um disco mais étnico ou antes uma actualização da linguagem nascida há pouco mais de trinta anos. Fica-se com a sensação insustentável de não se descortinar se estamos perante um caso onde a inspiração ainda não foi recuperada após o passo em falso de “Home Cooking”, ou antes uma cedência ao cada vez mais abrangente mercado da “world music”, procurando-se vender produto com um mínimo de qualidade não se arriscando contudo na radicalização da estética, que não lhe traria frutos comerciais provavelmente, mas levá-lo-ia para o mundo de bela agressividade então criado. Curioso é o facto de a editora , a Honest Jons do conhecidíssimo Damon Albarn fundador dos Blur, editou colectâneas relativas à Nigéria, mas sobretudo reeditou dois belíssimos álbuns de ex-companheiros de Fela Kuti, Tunde Williams e Lekan Animashaun, onde a pureza da energia sem ser modulada, ainda existe.
Penso que haverão duas atitudes em relação a “Lagos No Shaking”: para quem nunca ouviu Fela Kuti ou conheceu Tony Allen no seu
esplendor,e gosta de “world music”, desde que esta tenha um som puro e não fira, ficará contente, mas para alguns puristas, como é o meu caso, a decepção é imensa. Esperam-se melhores dias.






Autor: Studio One Soul 2
Comentários:

Havia uma ilha no mar das Caraíbas chamada Jamaica. Lá se geraram tribos e negócios de escravos, dando origem a uma raça com influências multiculturais. Embora relativamente isolados do mundo, todas as inovações do Século XX lá chegaram, e através da Telefonia Sem Fios, foram ouvindo uma música com capacidade de traduzir a raiz cultural de onde eram originários. Foi quase como um acto de resistência clandestina, só que o rádio não vinha de Londres, terra dos seus colonizadores, mas das costas Sul dos Estados Unidos, sobretudo Miami e Nova Orleães. Chamavam-se esses sons “rythm & blues”. Adaptando o que se ouvia ao folclore local, o “mento” (uma forma local de “calypso”), os Jamaicanos conferiram ao som de uma América em aceleração rápida de vida eléctrica, uma toada radicada no calor. E assim nasceram o “ska”, o “rocksteady”, o “reggae”, o “dub” e o “dancehall”.
Mas a questão "tribal" manteve-se ao longo dos tempos, sobretudo na produção musical onde reinavam os “chefes” Duke Reid e Clement "Coxsone" Dodd, este último era o “chefe” do Studio One. Haviam combates dos chefes, mas não se atiravam fardos de palha à maneira gaulesa, antes gladiavam-se com “sound-systems”, cantores e canções que cada uma gravava. Contudo, apesar de se manterem iguais a si próprios e em 1962 independentes, os jamaicanos formavam uma aldeia então aparentemente colonizada pelo cultura ocidental, mas onde esta era transfigurada para as conveniências primeiro locais, e depois para o resto do mundo, quando este não conseguiu resistir à "driving force" do baixo, da bateria, das guitarras em “contra-tempo”, das vozes mágicas e da melodia.
Studio One Soul 2, é como o nome indica, o segundo volume de versões de canções “soul” quase na totalidade vindas dos Estados Unidos, e é absolutamente deliciosa. As memórias da Motown, Nova Orleães ou até o intervencionismo romântico de Bill Withers, adequirem um carácter ainda mais criativo que os originais. E depois há uma versão instrumental de “Norwegian Wood (This Bird Has Flown)” dos Beatles, que é brilhantemente irresistível.
E assim se fez a história de uma ilha, capaz de encontrar em cada habitante um potencial músico ou cantor, espalhando uma poção mágica originária de raízes para o futuro, numa altura do mundo em que se brincava aos jogos de estratégia bélica, e não era na virtualidade, e “Patriots” não eram os cidadãos Americanos mas sim mísseis!

Encontros Passionais Com A Actualidade -Ano 2005

Autor: Jazzanova
Título: Jazzanova Remixes 2002-2005
Comentários:

Há gente que faz da remix, uma forma de vida. Krude & Dorfemeister, são mais conhecidos pela manipulação da matéria de outros, que pelas suas criações, e o mesmo se poderá dizer acerca dos Jazzanova. Agorfa que a hsitória já é conhecida na sua totalidade, para isso consulte-se o álbum "A Tom Moulton Mix" (embora uma viagem aos mestres jamaicanos nunca fique mal), é curioso como se olha para o acto da remistura. Este é sobretudo uma forma de um artista tentar trazer para a sua forma de expressão musical, o trabalho dos outros. E claro, a matéria-prima seleccionada, é quase sempre relacionada com o universo musical do remisturador.
No primeiro álbum de remisturas, os Jazzanova imprimiam um cunho de jazz electrético com a urgência do futuro que se vivia devido ao Século XXI estar à porta; agora ultrapassada a barreira, o estado de alma é mais calmo. A música perdeu um pouco o caracter de aventura, mas ganhou serenidade, sendo esta muito importante pois a abordagem torna-se mais ecléctica. Ouça-se, por exemplo, a remistura de "house" minimal, matém a estrura rítimica no mínimo para segurar o canto com derrames ocasionais de teclados, para "Flashback" dos excelentes Fat Freddy's Drop - em vez da vertigem perto do limite da queda, temos a alma a navegar por um mar calmo com uma onda um pouco mais agreste por vezes -, ou então a sublime versão da canção dos Clexico "Blackheart" onde a parte rítmica é acentuada conjutamente com uma ligeira limpeza de sons desnecessários em relação ao original.
Os Jazzanova, estão mais maduros, e isso reflecte-se no repertório escolhido, tendo-se lembrado que afinal, não é necessário ficar-se agarrado a um conjunto de convicções musicais, antes pode-se deversificar-se a escolha, pois quando se domina a actividade a exercer, não importa a base de trabalho sobre a qual se irão debruçar. No fim da audição, lembramo-nos como os Thivery Corporation eram sublimes no equilíbrio entre a diversificada música para trabalhar, e a imperiosa necessidade de nunca perder o sinal guia de universo de onde vinham.




Autor:Lindstrom & Prins Thomas
Títiulo:Homónimo
Comentários:

Há muito tempo que a questão existe: a música de forte pendor rítmico, terá de obrigatoriamente provocar a dança? Nem sempre. E os casos sucedem-se na história. O funk no domínio psicadélico de Sly b& The Familiy Stone em “There’s A Riot Going On”, usou apenas uma forma de expressão musical ligada a uma comunidade para retratar uma realidade social. Os reggae “roots”, embebido portanto da cultura Rasta, recorria a um ritmo altamente apelativo, para ser forma de canção de protesto. E para finalizar os exemplos, que dizer do ritmo intricado, tenso - entre um funk cortante e uma proximidade ao reggae mais sincopado – utilizado para a narrativa de horror de “Kalakuta Show”, quando o complexo residencial “Kalakuta Republic” do mítico Fela Kuti, foi vandalizado pela polícia Nigeeriana nos anos 70? Por outro lado, dentro do domínio da síncope, embora mais linearizada, o “disco–sound”, nasceu como consequência musical da comunidade “gay” sobretudo de Nova Iorque, poder exultar a vida como qualquer cidadão. E o “disco” dança-se?
A resposta à pergunta lançada no final do parágrafo anterior, é em princípio afirmativa, mas, poder-se-á encontrar uma breve negação. Reportemo-nos outra à história, para relembrar os deliciosos Deee-Lite, dos dois primeiros álbuns. Aí, o “p-funk”, o “disco”, o “house” o “hip-hop”, todos sem fronteiras definidas nas construção de uma canção, eram motivo de celebrar a alegria da música, não esquecendo a componente de preocupação social, como era o caso do mau uso dos recursos naturais do planeta Terra. Penso agora ter construído alicerces para fundamentar a minha tese em relação a Lindstrom & Prins Thomas. Começam por uma peça que se poderá considerar “disco-sound” vista um pouco à luz da electrónica de dança actual, não esquecendo contudo as lições deixadas pelos míticos Kraftwerk, desviando depois ligeiramente o sentido seguido da trajectória para iniciar um momento lúdico mas quase intimista, ainda em regime “disco” mas com uma aproximação ligeira à matriz do “p-funk”. Contudo a partir da terceira música inicia-se o sonho. Sendo um instrumental, estamos perante um momento onírico de viagem pela interior da alma, como se estivéssemos numa estrado pelo meio de uma floresta, e aí cada elemento da vegetação seria uma célula das nossas memórias. E, já agora, estando no domínio do sonho, onde as viagens são intemporais e físicamente ilimitadas, damos um pulo na nossa nave espacial e as estrelas representam momentos de redenção da nossa vida. Prosseguimos no cosmos, lugar de todas as paixões e invenções impossíveis de realizar num lugar terreno, até começarmos a deixar a reflexão e construímos uma aventura. Mas, um sonho não dura sempre, e temos de acordar, e por que não a sonhar com um mundo tecnologicamente perfeito, onde existe amor entre os homens, e não há horror, ódio e tristezas?
Nem sempre é possível encontrar o idealismo, mas a música de Lindstrom & Prins Thomas, alicerçada em estruturas rítmicas fortes, permite-nos imaginar um mundo idílico: E para terminar, então a música de forte pendor rítmico dança-se? Sim, mas há espaço da criar um lugar intimista, apelando esta ao movimento somente da alma.









Autor: Vários
Título: Acid
Comentários:

Foi o futuro, ou melhor dizendo, mais uma pista deste . O homem, sempre olhou para a frente, e continua a olhar, mas, às vezes, voltar à raiz das coisas, até pode ser uma forma de dar passos no sentido da vanguarda. Algures, no meio da década de 80, o que parecia ridículo, tornou-se nas mãos de experimentalistas, no início sem rumo marcado, uma estética básica na concepção mas que através dos tempos, foi estrutura suficientemente forte para aguentar a agregação de várias culturas.
De que trata afinal? De baixo e bateria, pois então, associados através de máquinas, para quem não sabia tocar um instrumento clássico, ou não o queria, procurando fazer do minimalismo sonoro, uma fonte de imaginação. Os meios ao dispor foram as máquinas Roland TB-303 (baixo) e Roland TR-808 (bateria), essencialmente. A inspiração, veio do disco-sound, maioritariamente, mas também da “new wave” electrónica inglesa. E quando todos dançavam estes sons em Chicago no clube “Warehouse”, lembraram-se de irem às lojas procurar música da “casa”. Os finos estrategas comerciantes, começaram a colar nas capas dos discos a etiqueta “house”, e assim se iniciava um embrião para mais um estilo da pop. Os historiadores, divergem quanto á importância dos divulgadores, mas há dois nomes concensuais, Frankie Knuckles e Ron Hardy. E depois, os acontecimentos foram-se sucedendo, sempre em busca de uma música onde se gerava essa rara qualidade de simbiose entre o corpo, a alma e o intelecto, de tal forma, que um dia alguém dançando umas faixas rítmicas, à volta das quais poucos mais sons gravitavam, numa discoteca chamada Music Box, ficou tão eufórico chegando a pensar que a água da torneira estava contaminada com ácidos. Nasceram nesse dia as “acid tracks”
Mas afinal o que é o “house”? É, na sua essência, o carregar a traço grosso da linearidade rítmica do “disco”, desprovendo-o acessórios desnecessários para impulsionar a dança, e com o decorrer do tempo, associou-se a outras formas musicais que também detinham essa função, como a “soul” e o “jazz”.
Foi tudo muito rápido e cirúrgico, mas mesmo assim, alguém teve a lucidez de ali descortinar o futuro enunciando-se como “Phuture”.

















Autor: George Clinton (CD Duplo)
Título:How Late Do U Have 2b B4 Ur Absent
Comentários:

O génio, perde-se com a idade? Será possível conservá-lo eternamente e recuperá-lo quando está perdido? As ocasiões nem sempre propiciam um momento genial e uma boa ideia pode não ser passível de ser repetida. Por exemplo, quando Paul McCarteney juntou a brincadeira dos “tape loops” à vontade e John Lennon de soar como Dalai Lama no topo de uma montanha, surgiu um dos mais fantásticos momentos da história da pop intitulado “Tomorrow Never Nows”, do álbum “Revolver”. Posteriormente, no “White Album”, “Revolution # 9”- também com manipulação fitas magnéticas e a voz de Lennon debitando “#9, #9” - apenas era mais um retalho experimentalista numa manta em degradação. Uma vez os Beattles separados, nenhum por si só foi capaz de construir canções com base experimental ou assentes na clássica arquitectura bela melodia – texto interessante – refrão e ponte, interessantíssimas, apesar da ideia ser válida. No entanto, nos mesmos parâmetros, Lou Reed e John Cale, fizeram discos ao longo dos tempos, que não mantendo permanentemente um nível muito elevado, estão longe de se deitarem no lixo.
Do parágrafo anterior depreende-se não ser a idade do artista e respectiva longevidade no ramo, a definir a capacidade de elaborar um bom disco, e o caso de George Clinton é sintomático. Com 65 anos, editou em 2005, a mesma fórmula do seu “psychadelic funk”, das vertentes Parliement e Funkadelic. Como ele próprio definiu, tudo se resume a “1,2,3,4”, isto é, marca-se o compasso e o movimento perpetua-se, mas o “p-funk”, é também um manifesto de cultura pop de aparente ilusão somente lúdica, onde a banda desenhada se cruza no espaço sideral em busca de um lugar onde as dimensões não são facilmente mensuráveis, por não existirem pontos de referência material tal como na terra. Assim, a banda desenhada no cosmos, é uma camuflagem para um acto de reflexão sobre o estado do mundo e da alma, num intervalo musical de origem “R&B” com possível acentuação da síncope. E até a hoje se mantém esta forma de vida.
“How Late Do U Have 2b B4 Ur Absent”, começa em potente “p-funk”, atravessa o tempo num registo de deslumbramento histórico da música negra: encontra-se a balada “soul” com vozes entre o “gospel” e os arranjos dos tempos do “swing”, os “rythm & blues”, o rap, reggae, deliciosas linhas de guitarra perto do “heavy-metal”, e ainda a capacidade que a música negra tem de se sustentar somente numa tela essencialmente com os desenhos rítmicos, havendo ilhas de guitarras e sopros. Esta viagem, teria de ser feita no cosmos, com um ovni claro, pois só na ficção se concretiza a síntese exposta, onde no fundo, tudo não passa de blues e é no espaço que estes encontram o lugar ideal para a eternidade. Não é por acaso que uma das célebres “Voyager” tem gravado no seu disco de ouro “Dark Is The Night” do mítico Blind Willie Johnson.

Autor: Flanger
Título: Spirituals
Comentários:

Num projecto que não é a solo, nunca se sabe muito bem qual das partes tem mais peso. Olhe-se para a história da pop, e logo nos lembramos da dupla Lennon\McCartney, que tantas e belas canções deu ao mundo nunca se sabendo exactamente qual a participação exacta de um dos membros na composição. E, para abordarmos exemplos mais actuais, podemos recorrer aos equilíbrios Morrisey\Marr e aos injustamente esquecidos McLennan\Foster dos Go Betweens. Tudo isto por causa do caso hoje abordado, o projecto Flanger de Burnt Friedman e Atom Heart, este último também conhecido por Señor Coccout mas sendo Uwe Shmidt de nome verdadeiro. Olhando para a carreira dos Flanger, só existe um elemento de coerência, o eclectismo. Começaram pelo experimentalismo electrónico, aproximaram-se dos ritmos latino-americanos, embeberam o jazz outra vez de electrónica, e agora aproximam-se da “dixieland”.
Aparentemente, quase se poderia considerar o percurso musical, como dois agentes criadores, onde um destina o caminho – Atom Heart – e outro segue-o na criação – Burnt Friedman. Mas, voltando à questão inicial, não sabemos verdadeiramente quem gere efectivamente o processo criativo, ou se este é partilhado. Uwe Shmidt, tem os seus heterónimos para cada personalidade musical onde navega, contudo, no caso do companheiro, estamos perante um ser multifacetado, que olha para a música como uma arte com possibilidades de ser vista de vários ângulos, e, consequentemente, experimentada. Friedman, só no ano de 2005, edita dois trabalhos opostos: de um lado a trajectória relativamente concêntrica em relação à origem da matéria, a América, sobretudo após o 1º álbum dos Flanger, e na outra face, ressuscita a canção, com quem a manobra exemplarmente, numa das suas formas mais perfeitas dos últimos vinte anos.
Continuamos a não encontrar uma resposta baseada em factos em relação à questão do primeiro parágrafo, mas uma certeza temos, um músico da era moderna e um estudante de arte que escolheu a música como forma de expressão artística, encontraram a via do jazz de Nova Orleães, para dissertarem - usando a harmonia e a melodia - sobre a manipulação do som. E pelo meio, encontraram um espaço lúdico com via para um futuro resultante do passado.
O disco começa com uma evocação às marchas fúnebres de Nova Orleães, para se debruçar, quase em toda a sua extensão, sobre a alegria da dança ao ritmo de “fox-trot”, lembrando que o jazz nasceu como acto de libertação e felicidade, evoca os mestres dos anos 30 e as histórias vividas no quotidiano de festa da “Bourbon Street”, havendo ainda espaço para uma "dedicatória" a Charlie Christian, um grande mentor da guitarra eléctrica.
É um momento de lazer, ouvir “Spirituals”, onde a decomposição sonora, levada quase ao limite do zumbido, nos transporta para um tempo que foi futuro, e ainda pode servir da base de trabalho para quem ama a música no Século XXI. A dupla Flanger, encontrou a cabine telefónica de Dr.Who, e visitou a história. Pena que alguém em quem depositava esperança, Herbert, legítimo herdeiro do compatriota britânico mencionado, tenha preferido o “holo-deck”, onde a virtualidade retira verdade genuína ao momento vivido.









Autor: Andre Orefjard
Título: Refreshment Of Thoughts
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O dia, se calhar, já ia longo. O cansaço abate-se sobre o compositor, impõe-se uma pausa para a reflexão: qual o caminho a escolher? O recorte formal da canção soul revitalizada pelos Soul II Soul, à luz dos acontecimentos dos anos 70 (daí a presença do piano eléctrico Fender Rhodes), reformulados como linguagem de futuro - porque não também lembrar Endemic Void nos anos 90 ? - , ou antes, uma síntese de parte da música negra dos últimos dez anos (o verbo declamado, caminhando ao lado da construção clássica da canção) ? André optou por esta última hipótese.
Refreshment Of Thoughts, é um disco belíssimo, com melodias delicodoces o suficiente sem resvalarem para o banal, e pelo meio, desperta-se para a realidade, através de um rap suavemente presente. Tudo muito bem construído, em superfície de veludo escuro, com pequeníssimas irregularidades agrestres. É um trabalho bonito, que se ouve com prazer, em noite de Inverno, para aquecer a alma desencatada com o mundo. E é sem dúvida uma excelente síntese da música negra, que peca pela horrível versão de “With A Little Help From My Friends” dos Beatles, provavelmente inspirada na esplendorosa transcrição gospel por Kim Weston de “Eleanor Rigby”, presente na colectânea “Soul Gospel” editada pela Soul Jazz.


Autor: Fat Freddys Drop
Titulo: Based On A True Story
Comentários:

A Aldeia Global, ganhou maior significado com a conquista do espaço, mas poderemos recuar séculos, para a descobrir, se bem que a uma velocidade mais baixa, mas não menos importante. As migrações impostas ou as imigrações existentes, quando o homem se aventurou milhas longe da sua costa natal, implicou intercâmbio natural, mais ou menos forçado.
A descoberta das Américas, e a posterior colonização, levaram ao encontro de culturas, que se foram ligando com intimidade, até gerar outras formas de expressão que passaram a ser matéria- prima virgem. Lê-se, por exemplo na também excelente colectânea “Dirty Laundry”, que uma das causas pelas quais houve nos anos 60 e início dos 70 uma aproximação da “soul” ao “country”, estava ligada ao facto dos colonos vindos da Irlanda , que traziam a sua música celta, sofrendo esta influência dos cânticos dos escravos negros. Mas, a cultura musical portuguesa ou espanhola, disseminada pela a América do Sul, encontrou nos povos migrados e nos nativos, uma fonte de vivacidade geradora do samba, do calypso, ou da rumba. E como os negros tornados escravos, tinham uma forma de expressão com traços comuns, independentemente do local geográfico onde se encontrassem, não admira haver uma proximidade tão grande entre a música do Sertão Brasileiro e o zaydeco de Nova Orleães. Portanto, as novas músicas, não esperaram por meios mais sofisticados de comunicação, para nascerem. Mas deve-se reconhecer a importância que a TSF teve, quando surgiu.
E a partir de agora, a história repete-se. Ouvindo as rádios de Nova Orleães e de Miami, os jamaicanos cultivaram uma nova semente de música de dança, e além de a implementarem no mundo, arrastaram com esta o “vírus” do “sound-system”. O disco, volta assim a tomar forma importante de divulgação musical, como aconteceu também em parte no início do século XX, mas com a possibilidade de ser interpretado como objecto sonoro para posteriores aplicações.
Os Fat Freddys Drop, estando geograficamente longe do mundo ocidental, nem por isso ficaram imunes a duas grandes vagas da música negra: o jazz e o raggae. E é por estas duas vias, que quase em jeito de brincadeira, como quem se inspira na capa de “Yellow Submarine”, que os Neozelandeses nos levam até ao seu mundo “Based On A True Story”.
Este disco constitui o segundo da carreira destes senhores, mas o primeiro de originais. Começa bem, com uma citação explícita Bob Marley, mas logo se segue uma demonstração de conhecimento da música jamaicana, pois faz-se um percurso rítmico pelo ska, flutua-se no mar azul do dub até se encontrar a matriz inicial. Depois, todo o disco percorre um ambiente ecléctico num registo marcado pela concertação do raggae – a fotográfia da captação do som da guitarra baixo com microfone como Sylvan Morris, engenheiro de som do mítico Studio One, é sintomática – e o funk - a secção de sopros é a responsável da coabitação e de servir de elemento de ligação histórico -, nos quais se derrama um fluido electrónico, ora na base de sustentação da orquestração, ora como ornamento de mais valia estética, e ainda serve de âncora rítmica para a canção, criando-se assim espaço para um ligeiro olhar do futuro. Depois, a origem geográfica dos Fat Freddy, cria espaço e tempo, para a filosofia ou a contemplação do amor.
Da Nova Zelândia, para o mundo, numa afirmação de fé aldeia Global.







Autor: Vários
Título:Motown Remixed
Comentários:
O mundo mudou muito, desde a queda do Muro de Berlim, perderam-se pontos de referência do ingénuo posicionamento do "bem" e do "mal", e James Bond, agora nem sempre tem opurtunidade de combater os seus velhos amigos Soviéticos. O "bem" e o "mal", transmutaram-se, mudaram de terra. Até os EUA, que protegiam a Europa com os seus mísseis, poderão ser olhados como um antro de gente facciosa que perdeu a noção dos valores. Mas, apesar de tudo, há indiscutívelmente uma nova Ordem Mundial, nem sempre "fora da ordem" - como cantava Caetano Veloso -, nem que para isso, seja necessário proceder a um "lifting" cosmético, consagrando no entanto a origem da raíz.
A colectânea "Motown Remixed", traz-nos exactamente essa regeneração de valores, algures perdidos no tempo, mas com riqueza embebida da necessária tolerância para ainda poder ser actulizada à luz da estética actual. Pegar num clássico do Jackson Five, mantendo-lhe a arquitectura onde foi alicerçado e conferir-lhe leves reforços rítimicos e umas pinceladas de "scratching" dando-nos uma sensação de uma boa canção soul hoje feita fora das normas FM, é louvável, olhar para uma estrutura rítmica por si só pré-esforçada de síncope esticando-a com novas e fortes vigas rítmicas sem lhe retirar o pendor dançável, exige uma boa atitude de sensibilidade de cáculo, e que dizer quando um hino psicadélico "Papa Was A Rolling Stone" é transformado numa canção "cool" para ser ouvida em bar de boa conversa com um refrescante laranja-vodka, mantendo-lhe o encanto? "Motwon Remixed", é um sublime acto de coragem, cheio de nervo, onde além de sermos levados a conhecer a música clássica da pop do Século XX, descobrimos agora melhor o significado que Jazzie B. pretendia com os Soul II Soul.
E claro, quem tem charme nunca o perde. James Bond, até poderá ser um "dinossauro da guerra- fria, sexista misógeno", mas nunca perde o encanto quando explica bem ao "barman" que pretende um vodka-martini, "shaken, not stirred". Assim acontece com este disco, como aliás se deveria depreender logo da capa.

Autor: Ernesto
Título: New Blues
Comentários:
A electrónica, por si só, nunca conferiu um estatuto de futuro se a base musical à qual se associaria, não tivesse o mínimo do interesse. Mas, depois da sua generalização no campo da pop, torna-se ainda mais difícil reconstruir o futuro. Os Massive Attack, por exemplo, pegaram em abrangentes “Blue Lines”, retiraram-lhes amostras e iniciaram mais uma via para a canção, os United Future Organization encontraram meio de conferir um estilo dançável ao “hard-bop” e ressuscitaram a “bossa-nova” tornando-a música de actualidade outra vez, e os Thievery Corportion sintetizaram a tradição dos “sound-systems” jamaicanos inserindo-os num contexto cénico onde a expansão é possível – afinal o cosmos é o lugar por excelência para o sonho. Os exemplo indicados, materializaram-se através dos meios electrónicos, que foram contudo, somente o meio para atingir o fim.
Mas a música electrónica, surgiu, quando o transistor ainda nem sequer era totalmente sonhado, chamavam-lhe electroacústica, e os Beattles viram nela a possibilidade da concretização de um sonho experimental. Agora, já não é necessário ter fitas magnéticas que percorram o estúdio, para manter um “loop” estável, sobre o qual se constroi uma música, como aconteceu com Herbie Hancock, basta um “laptop” com “pro-tools” e fazer “copy&paste”, e o “sacratching” também não implica um DJ treinado. Quase tudo é possível, à excepção da criação sintética da criatividade. Ernesto, vulgo Jonatan Bäckelie sueco de nascença radicado em Birmingham, resolveu lembrar-se que a pop, veio do rock, por sua vez com código genético dos “blues”, e assim partiu em busca da tradição. Talvez não tenha sido necessário sentir-se tentado pelo diabo num cruzamento da mítica “highway 61”, mas antes num encontro de informação na internet. Resistiu à tentação e seguiu rumo à tradição. “New Blues”, é disso que se trata, verdadeiramente; e poderia ter sido o caminho dos Massive Attack, não tivessem eles querido seguir a rota segura do apuro estéctico, antes de se perderem.

Autor: Vários – Massive Classics Volume 1
Década: Anos 70 e 80
Comentários:
Se algum dia oferecesse um disco a um político da nossa praça, que passa o tempo a queixar-se das colocarem citações suas na imprensa fora do contexto, dar-lhe-ia “Blue Lines” dos Massive Attack, e aconselha-lo-ia a comprar “Massive Classics, Volume 1”. Talvez então o nosso homem da política, percebesse que frases suas fora do contexto, poderão ganhar riqueza não presente na sua totalidade na forma original. Ainda bem, que chegou ao mercado esta colectânea. Permite-nos não só descobrir como de matéria prima usada, após reciclagem, se pode construir uma nova e bela realidade, além do prazer inquívoco da descoberta de onde partiram as ideias. Pode tudo não passar de uma estratégia de marketing, quando não há tempo para criar, ou até as ideias boas se esgotaram, mas depois de ouvirmos “Massive Classics”, voltamos compulsivamente a “Blue Lines”, e ouvi-lo-emos num estado de renovada e incontida alegria. E há ainda outra conclusão: afinal, também era rock...

Discos de Uma Vida

Discos de Um Vida

PREC - Pop Recomendado Evoluindo Constantemente


Autor
The Beatles
Título da Obra
Revolver
Década
60
Comentários
Os Beatles, juntamente com os Beach Boys,
viram o estúdio como instrumento, e não
somente objecto de registo. "Quero soar
como Dalai Lama, no cimo de uma montanha"
disse John Lennon, e Paul brincava com "tape
loops". O produtor, George Martin, foi a interface
interpretativa do pretendido. George e Ringo, tocam
maravilhosamente bem. Um álbum intemporal - e fecha o
clube dos "5".

Autor
Black Jazz Chronicles
Título da Obra
Future Juju
Década
90
Comentários
No fundo, era um projecto a solo de Ashley Beedle, que
no auge do ácido londrino dos anos 90, tinha composto com
os Ballistic Brothers, uma ode ao "London Emotional Hooligan".
Agora, recuperava as raízes da Nigéria, e juntou o "talking drum" da tribo
Yoruba à tecnologia de produção e criação sonora, nascida no seio da
"club culture". Pouco tempo depois, viria a comprar uma colectânea de
funk africano, e deparava-me, entre outros, com Fela Kuti. Iniciou-se
então um longo processo de aprendizagem, e aprendi termos como "Ibo", ou
"Highlife". Um mundo novo, com raízes do futuro, abria-se à minha frente.
Que paixão!

Autor
Bel Canto
Título Da Obra
White-Out Conditions
Década
80
ComentáriosUm álbum premonitório em relação a muita da boa música que hoje se faz. Vinham do Norte da Europa, usavam a eletrónica para comporem canções de âmbito ligeiramente atmosférico, e havia uma voz feminina, Annelli Drecker, de beleza relativamente próxima das deusas Elizabeth Fraser, Lisa Gerrard e Mimi Goese. O disco é muito lindo, mas é único digno de ser realmente comprado. Contudo Anneli, continuaria a encantar o mundo, em encontros com músicos da sua editora, a belga Crammed Discs, como Peter Principle dos Tuxedomoon, ou Hector Zazou da dupla Zazou\Bikaye. Perdi o rasto a esta menina, mas, como já escrevi, um farol para tanta produção de interesse vinda hoje do Norte da Europa. Pouco depois, o mundo ficaria espantado, com uma menina, inserida num grupo islandês chamada ...Björk.

Autor
Björk
Título da Obra
Debut
Década
90
Comentários:
Numa noite de insónia de 1988, ouvi uns Islandeses chamados Sugarcubes,
onde havia uma vocalista que fazia da voz um factor de risco, lançando-a nas
alturas e resgatando-a nos tons mais baixos, sem nunca perder o controlo; era
sublime! O "single" chamava-se "Birthday". A paixão foi imediata, e a menina
chamada Björk, foi um nome gravado no coração. Anos mais tarde, quando ainda
eu vivia na dictonomia pop com guitarras\pop electrónica - vejam como sou não erudito
eu não gosto de "múzca de dança" -, volto a ouvir a Islandesa acompanhada de um ritmo
fortemente inspirado no "house", com voz e apenas um zumbido associado a vozes de conversa de fundo. Estranhei! Era a Björk do rock pouco inspirado dos Sugarcubes, exceptuando a estreia? Depois comprei o disco. A capa era crua - apena uma rapariga despenteada sobre uma cor indefenível, perto do limite preto-e-branco, e uma etiqueta com "Debut" escrito. Inicei a audição: "If you ever get closer to human, A human behavior, You better get ready to get confused". As palavras são certeiras, o arranjo, fantástico: tambor, baixo de sintetizador e disparos curtos de teclado. Continuei. Agora a história era acerca do mundo urbano, das cidades frenéticas; ouvia-se a voz, um orgão, ritmo fluido de "house" e um piano com quatro notas repetitivas a intervalos com a função de manter os passos contínuos da canção. Sentia-se um suor frio. Björk ia para os limites de não aderência. E no fim, uma reverbação tão característica do "dub". Haveria ainda espaço para um momento de comtemplação de jazz paisagístico nórdico, vento e sopros com canto, e chorava-se a ouvir "violently happy, because I love you". E o mundo mudou. Tudo se sintetizava num disco; o recorte formal da canção, o ritmo nascido na jamaica, o experimentalismo electrónico e a coragem de sair do conforto estético.
Björk, é hoje uma estrela, graças ao seu desempenho fabuloso no filme "Dancer In The Dark", e continua, quase como acto de desespero obstinado, a procurar dar nas vistas, mas sempre pelo caminho do inconformismo, de quem busca o limite da criatividade, e Debut, seria nos dias hoje, um disco de tabelas, ultrapassando a falta de coragem de Madonna, largamente.
E para a história, é mais um produto indirecto de Bristol, ou não fosse o seu produtor o mítico Nellie Hooper, que também produziu "Blue Lines". Eu ouço este álbum e fico sempre consumido pela mesma dúvida: mais belo que o início profético dos Massive Attack?

Autor
Can
Título da Obra
Tago Mago
Década
70
Comentários
Aprendi num livro editado por Peter Shapiro, jornalista da
excelente revista Wire, que o rock alemão nascido na década
de 70, o chamado "krautrock", tinha como lema "see how vast
we can go", o oposto dessa coisa esquesita do rock progressivo,
onde se dizia "see how fast we can go". Realmente, vasto é o caminho
destes senhores alemães, de quem ainda só detenho o álbum Tago Mago.
Estamos perante um encontro de reconhecido território rock psicadélico,
mas com fronteiras próximas da música electro-acústica - assim era a
definição anterior à futuramente conhecida música electrónica. Logo,
o futuro, está presente. E se considerarmos ser possível ouvir um encon-
tro de experimentalismo munido de uma estrutura rítmica derivada do
afro-funk, concluímos ter visitado a luz da simbiose entre inteligência e
a bela utopia da arte.

Autor
Dream Warriors
Título
And Now The Legacy Begins
Década
90
Comentários
O hip-hop, já existia há mais de uma década, mas a base de recolha sonora
era essencialmente o funk. James Brown parecia que já só era um figura
virtual, e teve de gritar "I'm real". Entretanto, outras fontes de reciclagem
seriam descobertas. Porque não recorrer também ao jazz, para construir
a plataforma de declamação da palavra? Afinal trava-se de recuperar um
legado da cultura negra, uma das formas máximas de afirmação dos
afro-americanos, tendo-se até convertido num símbolo de libertação
do mundo. Logo na abertura deste álbum ouve-se o seguite:"What the
fuck is this?" A resposta a esta pergunta é elequente:"My defintion of a
boombastic jazz style". E o mundo encontrava novos caminhos de
reciclar o futuro.

Autor:
Durutti Column
Título da Obra:
Say What You Mean Mean What You Say
Década:
80
Comentários:
Geralmente, tenho aqui trazido essencialmente álbuns, mas já abri a
excepção de “singles”. Hoje escrevo sobre um EP, e é para mim, um dos
mais bonitos discos de década de 80. Vini Reilly realiza aqui um quadro com
um caleidoscópio de cores escuras, sobre o qual pinta uma linha de azul,
também não muito claro, a representar a melodia. E no entanto, há uma
intensidade de amor, ao longo de todo o disco. Quem disse então, que o
amor tem de ter cores vivas, para ser vivido intensamente? Por que não um
acto discreto, não poderá ser tão belo quanto uma ofuscante luz do sol, mas,
antes saboreado num belo recanto escuro da alma, não com pó, mas deliciosa-
mente cioso de intimidade?

Autor
Electronic
Título
Electronic
Década
90
Comentários
Este é um disco de redenção, de reconciliação. Irmãos "desavindos" da
mesma cidade, com um passado relativamente comum, mas cujos caminhos
divergiriam. Joy Division, porta estandarte de uma cidade, Manchester, destinados
a se tornarem lendas à nascença, gravaram "Atmosphere" e nós decorámos
"Don't walk away in silence", fizeram um álbum no limiar do desespero, "Closer"
- e nem o realizador inglês Mike Leigh foi ainda capaz de transmitir a mesma
ânsia de tristeza -, pois o voca lista Ian Curtis suicidar-se-ia. Como acto de
salvação interior, aderiram definitivamente às cores nocturnas,
e revelaram-se "a New Order". Do outro lado da barricada, os The Smiths.
Virtuosismo e intelectualidade lírica. Não assinam por Manchester, isto é,
pela Factory, e rendem-se à cooperativa de Geoff Travis,
em Londres, a Rough Trade. Separam-se no final dos 80's, com sarcasmo refinado
- "At the record company meeting, At the last they have a dead star" .
E depois, a redenção! Bernard Summer (New Order e Joy Division), Johnny Marr
(The Smiths) e ainda por vezes Neil Tennant (Pet Shop Boys), fazem um disco pop.
Sem pretensões, ou ambições, nada de grandes considerações estéticas,
apenas uma breve orientação para navegarmos: Electronic.
Estamos num mundo que se destina a Não Eruditos, àqueles que vivem a pop
pela paixão, e esta assumem como também fonte de alimentação da alma. A guitarra
está presente, mas não tem preponderância sobre o sintetizador. O inverso, é
igualmente verdade.
E assim se caminha, no meio de um jardim de canções tão lineares, quanto belas.
É tudo muito singelo, mas bonito.

Autor
Fela Kuti
Título da Obra
Open & Close / Afrodisiac
Década
70
Comentários
É-me quase impossível escolher um disco de Fela Kuti, com o
seu baterista Tony Allen. E este que aqui trago, constitui uma
excelente introdução, e também síntese para um mundo de força de
vida, de amor, inabaláveis. O "highlife", a música de encontro entre
o jazz dançável dos colunizadores e a raíz africana, foi o primeiro
cristal líquido, antes de se solidificar como "afro-funk". Neste álbum,
ainda não se grita a liberdade, mas esta está inerente na música.
Como ouvir? Estando sentado e contraindo o músculos, procurando
a perfeita fase entre intelecto e emoção. E uma audição, não basta.
Descubram o padrão rítimco, o solo do orgão, a "riff" da guitarra, e a
genialidade de jogando com a entoação e o tempo das notas, se traz
à luz um solo de saxofone deslumbrante (feito por Iggo Chico). Fela,
aprende-se, ouve-se sempre, assimila-se com a frescura da
descoberta. É o que se pode chamar de um caso em que ficamos "drunk
with passion".
Nota: Já agora, procurem a colectânea Nigeria 70, para conhecerem
a riqueza de um tesouro.

Autor
GNR
Título
Psicoprátria
Década
80
Comentários
Este é um território delicado, onde o meu conhecimento é muito parco.
A pop portuguesa ressuscitava, e aproximava-se dos padrões internacionais.
Chamava-se Música Moderna Portuguesa e teve o seu templo sagrado no
"Rcok Rendez-Vous", em Lisboa. Depois de "Chico Fininho" de Rui Velsoso,
descobriu-se que afinal era possivel cantar "rock" em Português. E muitos
autores fizeram canções esplêndidas. Mler Ife Dada, experimentalistas por
excelência, António Variações, um visionário, Pop Del Arte, como tudo
indica, é um conceito de cultura "popular". Até que chegamos a "Psicopátria".
Não será o mais belo álbum pop do nosso país até hoje, mas contém um equi-
líbrio notável de linearidade e sofisticação. Além disso confirmou-nos um músico
excelente, Alexandre Soares, cujo "Projecto Global" permanece esqeucido na
prateleira do génios pouco lembrados.
Voltando aos GNR, este foi o seu disco que mais ouvi, embora os anteriores
sejam excelentes.

Autor
Go Betweens
Título
Tallullah
Década
80
Comentários
Não foram aclamados como os Smiths, nem tiveram o reconhecimento do
compatriota Australiano Nick Cave, contudo, de forma discreta, compuseram
das mais belas canções da década de 80. Deixaram versos deslumbrantes, ora
leiam: "I recall a bigger brighter world, A world of books and silent times in
thoughts". Como se não bastasse, fizeram o "Yesterday" dos anos 80, "The Wrong
Road" (incluida no álbum Lberty Belle And The Black Diamonds Express").
"Tallulah" é o seu quarto álbum, e representa a consolidação estética, do até
aqui fizeram. E há uma particularidade, em vez de solos de guitarra, temos
de cítara, ou de oboé: lindo!
E depois há aquela poesia desconcertantemente bela. Há versos onde do meio
da simplicidade, sai um aforismo sobre o amor. Não percam, por favor.
Nota: Voltaram a editar neste século, inclusivé este ano.

Autor
John Coltrane
Título da Obra
A Love Supreme
Década
60
Comentários
O meu primeiro disco de jazz.A minha primeira
e contínua paixão no jazz. O amor emanado é
"Supreme".

Autor
Krafwerk
Título da Obra
Man Machine
Década
70
Cometários
Ouvia a colectânea "New Thing" editada esta ano pela belíssima
editora\loja de discos londrina Soul Jazz, e apeteceu-me outra
vez voltar a "Man Machine". Curiosamente, este foi meu primeiro
disco de música electrónica sem o saber! E depois sabe sempre bem
descobrir as raízes do futuro. Parece que ouço uma tradução de um
sonho já vivido, projectado nos dias do amanhã. Sinto-me perante
uma possível Banda Sonora para "Solaris" de Tarkovsky (espero ter
escrito o noem correctamente deste realizador).
Os Alemães Kraftwerk, foram edificando um edifício cuja estética
ainda permanecia num domínio essencialmente erudito e experimen-
talista, com possibildades de ter um aspecto ascéptico.
Mas, mesmo assim, conferiram-lhe contornos próximos da humanidade,
nem que os habitantes fossem "Man Machine". E para finalizar, há ainda
uma das mais belas canções pop de sempre: "The Model".

Autor
Lee “Scratch” Perry
Título da Obra
The Upsseter – 4xCD
Década
1968-1978
Comentários
Quando se começa a gostar de alguma coisa, o conhecimento
cresce exponencialmente, pois antes nada se sabia. No meu
percursso pop, sabia que algum dia as coisas tinham de acontecer.
Por causa dos Cinematic Orchestra, conheci John Coltrane, devido
aos Koop, aprendi que “Kind Of Blue” de Miles Davis, era considerado
um disco de “jazz modal”. E ouvindo toda a electrónica produzida nos
últimos 15 anos, seria necessário conhecer a música jamaicana. A
colecção “Studio 1” da Soul Jazz, é um excelente manual cujos fascículos
nos vão permitindo docemente, conhecendo um tesouro maravilhoso. E
os nomes vão-se sucedendo, e a curiosidade, até ansiedade aumenta.
Graças à revista The Wire, soube da edição “The Upsseter”, dedicada a
Lee “Scratch” Perry, nascido Rainford Hugh Perry. “Scratch”, vem de “Chicken
Scratch”, canção ainda gravada para o “Studio 1” de Clement “Coxsone” Dodd.
“Upssetter”, auto-intitulou-se Perry, quando se zangou com Dodd.
A história continua até aos dias de hoje. E a música? É brilhante.
Estamos perante um génio, que confere ao “raggae” um brilho invulgar.
A paixão é avassaladora. As canções, algumas são tão bonitas, que até choro!
São quatro CD’s, amostra de uma vastíssima obra
como compositor e produtor. A edição é muito boa, pois aprende-se mais um
bocadinho sobre a vida do “raggae”. Agora, nasce outro problema: quero ter mais
discos! Por que, a música ouvida, irradia uma luz muito forte na alma,
e esta, assim, nunca estará triste. Para um aprendiz, como eu, é INDISPENSÁVEL.

Autor
Massive Attack (Devido à Guerra do Golfo, apareceram primeiramente como Massive.)
Título da Obra
Blue Lines
Década
90
Comentários
"Gostamos de Pink Floyd a Joy Division". Só ao fim de dez anos,
após conehcer Raggae, Dub e Soul, percebi quanto as "Blue Lines"
poderiam ser tão abrangentes. Um disco que descubro, ainda, em
cada audição. Maravilhoso! E um dos cinco discos ca minha vida.

Autor
Material
Título da Obra
The Third Power
Década
90
Comentários
Bill Laswell, chegou a Nova Iorque quando esta tinha a New Wave e a No
Wave. Optou pela segunda, e agraciou o prefixo "No", para fazer "Not Disco".
Com os Material fez uma esplêndida fusão de soul com disco-sound, no fundo
uma consequência da soul de Filadéfia. Na década de 90, publicou "The Third
Power". É um sincretismo absoluto de "p-funk", "raggae", "dance hall", e "dixieland".
O baixo, funde-se com a tuba, as palavras declamadas, complementam o canto.
Depois, o "casting", é maravilhoso. Sly & Robbie (mágicos do ritmo jamaicano),
Shaba Ranks (do moderno "dance hall" da jamaica), Bernie Worrell e
"Bootsy" Collins (da família Parliement\Funkadelic), Jalal (dos Last Poets), Herbie
Hancock (dispensa apresentações), entre amigos da tribo Laswell. Conclui-se então:
um disco muito lindo.

Autor
Miles Davis
Título da Obra
Kind Of Blue
Década
50
Comentários
C uriosamente, o 1º disco de jazz que entrou em minha casa, foi do Miles Davis, fruto
do empréstimo de uma amiga. Posteriormente, como consequência de uma entrevista
dos Cinematic Orchestra, comprei "A Love Supreme" de John Coltrane, que particpa em
"Kind Of Blue". A importância para a história, é que terá sido o primeiro álbum de jazz modal.
Como reconhecer o "modalismo"? Geralmente toda a melodia é descrita sobre uma base
de dois acordes. E se nos concentramo-nos na harmonia, observamos que há um som comum,
uma nota musical, que nunca fica fora de tom - não desafina. Também no regime modal, os
acordes parecem estranhos, não naturais, pois está-se fora do âmbito de uma escala diatónica.
Com este disco, compreendi o jazz modal, assimliei o cruzamento de escalas (modos), e aprendi
a estrutura de um "12 bar blues" (um "blues" cujo ciclo melódico se repete ao fim de 12 compassos).
Ouvir este disco, é um equilíbrio entre a felicidade da música e o prazer de aprender.


Autor
Nicolette
Título da Obra
Now Is Early
Década
90
Comentários
Descobri esta cantora da forma mais estranha: arrumava o quarto e tinha
o rádio sintonizado na Antena 1: gloriosos tempos! O Mestre Ricardo Saló,
divulgava uma música, onde uma tela branca era essencialmente preen-
chida pela voz de uma senhora – chamaram-lhe Billie Holliday On Acid -,
com contornos em duas linhas de azul escuro, não muito grossas,
simbolizando uma bateria e um baixo, e ao lado destas umas flores amarelas,
pequeninas iam surgindo, materializando então esporádicas aparições
harmónicas de um sintetizador. Que belo era este quadro minimal mas poderoso!
Ainda era cedo, profetizava o título do álbum; contudo, uma semente do futuro, surgia.

Autor
Primal Scream
Título da Obra
Screamadelica
Década
90
Comentários
Ao contrário dos eruditos, eu não acordei um dia a gostar de "muzca de dança"- assim
falam os mencionados. Tive um processo de aprendizagem e consolidação de 5 anos.
E foram discos como este, que me levaram para um campo, através do qual cheguei ao
jazz, aos blues, à soul, ao funk, ao afro-funk e ao disco-sound. Os Primal, eram uns
rapazes simpáticos que tinham gravado umas cançonetas do tipo Birds. Mas, depois
de beberem ácidos, resolveram gritar a inteligência. O psicadelismo é a base de partida.
As citações aos Rolling Stones, estão presentes, mas a escola do "dub" e "dance hall", o
caminho desbravado pelos Soul II Soull, o polo aglutinador de alegria que ainda era
Manchester, e o sabor do rock pensado sob o efeito da meditação, compuseram um
disco muito importante, para muitos de nós, não eruditos. O "house", o apelo à dança ("gonna
dance to the music all night long"), a paixão simples pela música ("all these are labels, because
music is just music") e até o "dub" (nova palavra no meu léxico pop), proporcionaram-me
uma aprendizagem enriquecedora. Além disso, tenho o disco em vinil, o que reforça o
pendor clássico.

Autor
Ride
Título
Nowhere
Década
90
Cometários
Houve uma altura onde o meu caminho na pop não estava definido. Entre os grupos de
guitarras, onde tinha feito a minha introdução à pop "indy", e a música electrónica,
cuja produção começava a sintetizar o futuro, procurava um equilíbrio longe de ser
estável. Ouvi "Nowhere" numa noite de fim de ano, e senti uma atracção que gerou
ansiedade até comprar o disco. Quando o tive, mantive com este uma intensa relação
de amor. Custava-me separar deste, esperava com ritmo cardíaco elevado, o dia em que
o voltaria a ouvir. Além disso, o céu esperava-nos: "Looking down I see you far below,
looking high I see your spirit glow".

Autor
The Meters
Título
Look-Ka Py Py
Década
70
Comentários
Foi ao ler um artigo sobre os Poets Of The Rythm (não acham este nome
bonito?), que fiquei a saber da existência dos Meters. Depois, ouvindo
a excelente colectânea "New Orleans Funk", dei-me conta de como uma
precisão rítmica poderia ser criativa. Além disso, há um orgão a jorrar
harmonias de carácter melódico, com uma guitarra seguindo-o de perto.
Afinal, James Brown, não é o único capaz de fazer da síncope, um acto
saudável.
(Nota: os Poets..., editaram um álbum em 2000)

Autor
The Smiths
Título da Obra
The Queen Is Dead
Década
80
Comentários
Interrogo-me muitas vezes quais terão sido as melhores duplas
de "sing\song writers" do Século XX, e se Lennon\McCartney estão entre
os melhores, mas também o ténue fio emocional de Reed \Cale provocou a
precipitação das mais sólidas emoções pop de sempre. E Morrisey\Marr?
Para minha paixão, estão em segundo lugar atrás da dupla dos Beatles.
Além disso, as suas canções são de um desespero belo: "to die by your side,
is such a heavenly way to die".A voz de Morrisey, percorre a linha da
melodia com toque de tristeza consciente, de quem faz isso alegria. E Marr,
pega na guitarra, e constroi mantos incandescentes para confortar a alma
triste de cores vivas, das letras. Um dos mais importantes grupos dos anos
80, uma deliciosa vida de amor pop, para quem desta música gosta.

Autor
The Smiths
Título
Sheila Take a Bow
(7”)
Década
80
Comentários
Um amigo de um amigo, um dia teve um pensamento
Filosófico: “tudo o que não tem dupla pedaleira ou
distorção, não é rcok”. Parece simplista, mas não anda
muito longe da verdade. Como realmente separar a pop
do rock? Uma canção dos Smiths, não tendo distorção,
é reconhecidamente pop, mas, ouvindo a abertura
do álbum Daydream Nation dos Sonic Youth, com guitarras
quase cristalinas como água com gás, com apenas um ligeiríssimo travo
de bolhas distorcidas, como a classificar? Pop? Rock? Pop-rock?
Rock-pop? No arranjo que Marr fez para “Sheila…”, a música
começa com um “riff” de guitarra, que parece vir do “heavy-metal”.
Depois, tudo se desenrola em camadas de guitarras, como metal em fusão,
mas em tons suaves. Do ponto-de-vista musical, este é, para mim, o mais
perfeito equilíbrio entre o pop e o rock. E claro, existem as letras. Os
aforismos, sucedem-se de verso em verso. Quem poderá resistir a isto?
Ora leiam (e penso que é mais ou menos assim): “Is it wrong not to always
be glad, It’s not wrong but I must add, How can someone so young look so sad?
Sheila take a bow, take a bow now, Put the grime of the world in the flush here,
And don’t go home tonight, Come out and find the ones that you love, And who love you”.
Se estavam tristes, aqui têm uma solução para e felicidade.

Autor
Ten Thousand Maniacs
Título da Obra
In My Tribe
Década
80
Comentários
Há discos, com os quais, se cria uma empatia logo à partida,
mesmo sem os termos ouvido. Li no Expresso que os 10000...
não tinham versos, mas prosas, e depois vinha uma tradução de um excerto.
Quando comprei o álbum, encontrei o que esperava. Canções belas, mas lineares em
perfeita harmonia com a prosa, os arranjos eram simples – apenas duas camadas de guitarras em metal de fusão de cor branca, um orgão, uma bateria e um baixo –, e a
consolidar tudo, a voz serena de Natalie Merchant, a cantar como quem lê um texto.
O disco foi dissecado, como quem mata a sede de conhecimento pop em fase de crescimento. Era em vinil, e gastou-se. Andei quase 15 anos, para o repôr em CD. Até que, este verão, tive a suprema feliciadade de o poder ter, outra vez, em vinil. A emoção forte, começou logo ali: para um não erudito -não leio o Blitz e muito menos o
suplemento “Y” do Público-, apenas apaixonado pela pop, não há nada mais comovente, que iniciar o rirtual de audição à antiga: começa-se pela face “A” ou “B”?
Olha-se para os dois lados da capa, lêem-se notas, e indaga-se o som ali contido.
Reeiniciei então o actos descritos, agora com mais alguma cultura musical, e
emocionei-me. Que disco tão belo! Aquela voz percorre a canção em tons de luminosidade absoluta. Continua apelativo, este trabalho ao fim de 17 anos!
Não está no culto – lembrem-se, quem gosta deste disco, não lê o “Y”, e os anos 80 foram para além de Joy Division, The Smiths, ou The Cure -, mas, qualquer hsitória, tem as suas notas de rodapé, e algumas delas, até podem conferir felicidade.

Autor
Triffids
Título
Calenture
Década
80
Comentários
São igualmente Australianos, como os Go Betweens, mas permanecem na
sombra da pop desconhecida carente de reconhecimento. Além disso, não
tiveram a sorte de construirem um quase "hit", para ser trauteado, como os
Go Betweens tiveram com a canção "Streets Of Your Town". A estrutura de
composição, foi sempre complexa, mas não com um pendor tão dramático
comparativamente a Nick Cave And The Bad Seeds. "Calenture" surgiu numa
bruma de raro perfume transmitido por um sinfonismo romântico pouco
habitual. Só o conseguíamos no mercado de imp0rtação, até que teve
direito a edição nacional. Continuou esquecido, mas não para quem
no meio das lágrimas ouviu "bury me deep in love".

Autor
Velvet Underground
Título da Obra
"Banana" Album
Década
60
Comentários
O mais belo álbum de sempre da pop? Talvez.Um dos cinco discos da minha vida.

Autor
Velvet Underground
Título da Obra
VU
Década
Editado na de 80, mas são gravações dos anos 60.
Comentários
Antes de mais a história. Depois de terem assinado pela Atlantic, os Velvet tiveram
de deixar canções gravadas na editora Verve, à qual pertenciam. Estas perderam-se
nos arquivos, e foram descobertas quase vinte anos mais tarde.
Agora a música. É com canções de finais de 60, que os Velvet surgem numa década
onde a canção fez as nossas delícias da pop. E fica-se aterrorizado, perante a actuali-
dade da estética. Percebe-se como os Sonic Youth se inspiraram numa percussão forte
e sensível, ou até num "riff" de guitarra perto da distorção, ou onde os Television se
inspiraram para gravarem Marquee Moon. E as canções, são estrondo-
sas! Perco-me quando ouço uma "brincadeira" onde se canta "I know where temptation
lies, Inside of your heart", e choro ao ouvir "I'm sticking with you, 'Cause I ran out of glue".
Nico já não está neste disco, e nem sempre John Cale, cujo violino traça uma linha
sigelamente melancólica linda, ao longo de "Stephanie Says". Mas, é aqui que apreciamos
o espelendor de génios, a beleza que um momento pop musical pode conter. E para
terminar, a capa. Um potenciómetro, dqueles que se viam nos gravadores da década de 70,
os indicadroes VU,com uma agulha a caminhar para o vermelho, e o fundo preto.
É um indicador do caminho da paixão.

Autor
Vienna Tone (Compilação)
Década
90
Comentários
Nos anos 90, não haviam lojas de discos como hoje,
nem Internet para os comprar, mas existiam redutos, quase clubes privados
para apaixonados, onde se encontravam os discos que nos faziam suores
frios pela espinha, tal a força de futuro emanada. E as compilações, passaram a
ser manifestos do advento.
Numa tarde de Agosto, subia a Travessa da Queimada, no Bairro Alto em Lisboa,
com a ânsia de chegar ao número 33, mesmo no topo da subida. Mirei os discos, e o mítico Zé Guedes, guardião desta pequena ilha da felicidade, disse-me: “espere, aqui
não há nada para si”. E eu, fiel seguidor, esperei. Pôs-me três CD’s em cima da mesa, e disse-me: “isto é para si”. Comprei, agradeci, e parti. Lembro-me perfeitamente de olhar com ar estranho para “Vienna Tone”. Que seria? Afinal, o percurso de aprendizagem era feito sobretudo através do “trip-hop”. E quando ouvi o disco, fiquei deslumbrado. O som fundia-se, os limites do instrumento e do “sample”, desapareciam; o formato pop, era reconhecível, mas sentia-se ali uma vanguarda, onde os limites eram novos. Sobretudo, quando se encontrava “Chocolate Elvis”, dos Tosca.
Como escrevi, foi um manifesto, de uma cidade de música, a acompanhar os tempos novos, mas também o establecimento, do que eu viria a chamar “A Questão da Europa Central” (Aústria-Alemanha-França). E Kruder, Dorfemeister ou Waldek, por exemplo, punham no mapa pop, uma estéctica nascida do empirismo inglês, ao qual se juntou o romantismo francês, e estes senhores, adicionaram gotas da mais perfeita relação de racionalidade\paixão.

PS Os discos são muitos, maxis e álbuns, mas desta época não percam “Opera” dos Tosca.

Autor
The Wire
Título
The Ideal Copy
Década
80
Comentários
Comprei este disco, quando comecei a conhecer a verdaderia arte da pop.
Nesses idos tempos, não lha chamávamos “pop alternativa”, ou a designávamos
por “pop indy” (adivinhem?!), ou então, “Som Da Frente”, numa alusão ao
célebre programa de rádio do Mestre António Sérgio, na altura excelente
Rádio Comercial. Os Wire, foram “punks” de 77, tendo-se desmembrado em
vários projectos como Dome, He Said, ou álbuns a solo. Eram intelectuais para
o ambiente britânico, pois formaram-se na universidade, não vindo directamente
da classe operária. O seu som, já era um acto relativamente rude de vanguarda. O
nosso Mestre Braga, até gosta muitíssimo do 1º disco destes senhores – logo temos
um porto seguro. O que ouvir aqui? Umas guitarras semi-atomosféricas, com ritmo,
vozes entre o tom quase coloquial e uma doce pequena presença de melancolismo,
e textos surreais – “They’re checkin the traps, To one of the chaps, In the black room, Jimmy is counting the steps, Death in the living room, His favourite sport, A happy year, The point of collapse”.
Após este regresso, continuaram a produzir música sempre interessante, às vezes até
em zonas perto do contemporâneo, mas “The Ideal Copy”, é uma charneira entre dois
tempos, onde a estrutura de sutentação da canção, não perdeu consistência, apenas se agilizou, fruto da evolução intelectual dos seus membros. Eu tenho uma particular paixão pelo cantor Colin Newman.

Autor
Young Marble Giants
Título da Obra
Colossall Youth
Década
80
Comentários
As cores, são parcas, a voz percorre a alma
suavemente, as canções, são tão belas
quanto simples. O disco, é eternamente jovem.
Pertence ao clube dos "5".